segunda-feira, março 29, 2010

Desculpe-me

Desculpe-me por ter usado e depois jogado fora. Não pude conter meus impulsos e, sem ti, não haveria outro modo de materializar nossos sonhos, torná-los concretos e tão belos.

Se rasguei tua alma, quebrei seus ossos, cortei-te a pele e esfarelei teu cerne até que nada mais restasse, não foi por simples egoísmo ou sadismo!

Apesar de tudo, deixou-me manipular-te sem reagir! Fez isso por heroísmo, ou simplesmente fostes incapaz de lutar, de livrar-te das garras deste habilidoso tirano?

Como sinto falta do tempo em que podia tocar-te sem que escorregasse por entre meus dedos trêmulos, quando ouvia com atenção tudo que tinha para dizer-te! Os sonhos que outrora sonhamos juntos, agora estão perdidos, despedaçados, divididos por cortes limpos e retos, porém vivos!

Tiveras seu uso, no entanto, custou-me muito pouco e sabes que ninguém há de dar valor ao que é barato, medíocre. Certamente, da próxima vez, buscarei mais qualidade, mais personalidade e sofisticação, mesmo que custe-me alguns tostões a mais.

Talvez ainda encontre salvação nas mãos de uma pessoa menor, menos habilidosa do que eu. Talvez vá para o lixo, apodrecer em algum lugar distante junto a outros incontáveis restos que desprezei, depois de sugar-lhes as mais preciosas essências.

Quem sabe decida usar-te por mais um tempo? Somente a mim pertence tua alma e se dela ainda sobra algum pó, cabe a mim decidir teu destino.

Não te sintas só, tampouco me odeie! Não tens esse direito! Mais virão depois de ti, incalculáveis mais e por vontade ou não, sacrificar-se-ão para viver a glória de servir fielmente meus desejos mais profundos e imprevisíveis!

Onde não havia nada, agora vives! Fragmentei tua existência, tornei-te onipresente e enquanto a Terra não arder nas chamas do juízo final, viverás! Entendes o valor de tal sacrifício?

Agora, que estás quase em teu fim, deita-te carinhosamente ao meu lado e vislumbre as maravilhas que através de mim podes criar! Suplico-te que entenda que salvei-te da inércia, não para dar-te a morte mas para abençoar-te com a vida eterna!

Se antes não valias nada, agora vales mais do que minha própria vida!

Repousa então em paz, sabendo que tua alma agora é eterna, embora de teu corpo, reste tão pouco. Perdoa-me, pois estou certo de que já não mais me tens como um simples cafajeste.

Dê logo seu último suspiro para que eu possa encarregar-me de teus restos! Não vês que tenho pressa? A ansiedade me consome a carne e, já que a ti não posso confiar o fim dessa nova obra, tenho que ir à luta, buscar uma nova e melhor versão de ti.

*Em memória do meu lápis Faber-Castel preto, 2B. 2009-2010.