terça-feira, setembro 29, 2009

Deletando a existência.

Um fenômeno muito comum, que tenho presenciado com frequência, é o do "deletamento" ilusório da existência dos outros.

Se um relacionamento, de qualquer natureza, não toma o rumo que se espera, ao invés de tentar resolver, dar um ponto final ao mesmo, entrar em um consenso através de toda nossa capacidade investigativa, a primeira coisa que fazemos é deletar a contra-parte de todos os nossos dispositivos de transferência tecnológicos.

Aparentemente, existe a ilusão de que, apagando determinada pessoa da agenda do celular, deletando todas suas mensagens de texto, excluindo-a de sua rede social favorita e de seu programa de comunicação instantânea, apaga-se literalmente essa pessoa, anula-se sua existência.

Na minha opinião, essa é uma atitude muito imatura mas, de certa forma, compreensível, se entendermos que ainda somos crianças, perdidas diante de toda essa revolução tecnológica. Pode até parecer que esse seja um caminho fácil e eficaz para apagar alguma parte da sua história, no entanto, sabemos que não é assim que as coisas funcionam.

Essa espécie de assassinato existencial, de fato, prejudica muito mais o assassino do que o assassinado.

Nosso inconsciente, de alguma maneira, em termos leigos, conhece a ineficácia desse tipo de transferência de responsabilidade e, acreditando ou não, ele reage. Como sei disso, sei também que uma das piores coisas que se pode fazer, em termos de danos psicológicos, é comprar uma briga com seu inconsciente.

Como dizia Jiddu Krishnamurti, esse tipo de atitude gera medo, por se ter certeza de que a outra pessoa ainda existe, independentemente de você querer ou não, o que faz com que esse indivíduo acabe por se apresentar como uma ameaça ao seu frágil equilíbrio mental. O medo, por sua vez, gera diversos outros conflitos que, por sua vez, não podem ser resolvidos por outro caminho que não seja o da investigação, auto-análise e meditação.

Quando me refiro à meditação, não estou me referindo ao seu sentido oriental ou esotérico. Me refiro à ela como o ápice da investigação psicológica do Eu, onde não existe mais a divisão entre o consciente e o inconsciente, onde pode-se julgar e analisar seus conflitos de forma una, holística.

Certa vez, Jean-Paul Sartre disse: "O Inferno são os outros".

Eu não quero me tornar o inferno de ninguém, apesar de saber que já ocupei essa posição algumas vezes. Prefiro conversar, dialetizar e chegar à alguma conclusão definitiva, para que eu possa preencher um lugar em meio às boas lembranças, aquelas que não se têm a vontade de apagar.

No entanto, se alguém, movido pela raiva, medo ou negação, resolver me apagar de sua vida, já aviso de uma vez que isso é impossível. Nem adianta tentar pois, aí sim, assumirei um cargo vitalício dentro de um de seus infernos particulares.

Como disse René Descartes: "Cogito, ergo sum". "Penso, logo existo".

Com base nisso, posso dizer que eu existo, existo muito. Se passei pela vida de alguém, se fiz alguns estragos ou se me transformei em boas memórias, não faz a menor diferença.

Se eu morrer, mesmo assim continuarei existindo na mente dos que ficaram.

Portanto, o único jeito de me apagar, deletar, é através de uma lobotomia, doença degenerativa ou suicídio e, mesmo assim, sabe-se lá... Talvez eu ainda persista.

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Um comentário:

  1. Uma unica coisa que tenho a falar a respeito: a perfeição não existe, sendo buscar por algo perfeito é impossível, tudo acontece na hora e momento certo...

    Pablo Lopez

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